Tuesday 18 December 2012

3º Ano da Guerra



      3º Ano da guerra
                Tecis – o último bastião do Sul do reino de Orago – erguia-se majestosamente com as suas altas torres de granito a olhar as chamas vermelhas ao longe.
     — FOGO EM AMALID! – gritou o guarda da guarita.
                O sinal luminoso foi lançado, e as tropas aquarteladas no grande edifício de pedra no meio do forte saíram a correr para os cavalos. Não eram muitos, mas entre eles estavam os quatro mais poderosos guerreiros dos Reinos das Montanhas. O destacamento cavalgou por entre a noite fria, pelas ervas baixas e pela mata nua, com os generais à frente em cavalos pretos como mandava a tradição. Os soldados atrás vestiam armaduras completas de aço. Eram todos disciplinados, treinados pessoalmente pela ceita militar chamada de Warlords. Os quatro generais vestiam elegantes armaduras de aço feitas à medida, cobertas com um característico manto preto encapuzado, com uma águia poligonal bordada em cor de sangue no peito.
                Por entre a bruma viam as colunas de fumo ao longe, iluminadas pela luz ardente que inundava a pequena aldeia de Amalid, na fronteira do reino de Orago, o reino mais a Este dos dois Reinos das Montanhas, aliados na guerra contra o que quer que fosse que vinha da Montanha Preta. Hamut e Hera, do reino de Inur’l, ainda não se tinham habituado a estar em território que antes fora inimigo, combater ao lado destes, e comer nos seus salões. Mas a guerra, como o amor, não olha a vontades. Os cerca de cem cavaleiros entraram numa zona de vegetação cerrada, onde, na noite, uma estrada de terra negra era pouco visível. As estrelas esconderam-se, e os fogos de luz laranja e amarela, antes tão aterradoramente brilhantes, perderam-se por entre troncos, e ramos, e folhas.
                Uma explosão de cores atirou a primeira metade da coluna de soldados ao chão, e a segunda caiu ou perdeu-se por entre a mata ao encontrar tamanha confusão. Gritos e berros soavam por entre a escuridão. Tochas caíram nas ervas secas. Rapidamente chamas consumiram a folhagem rasteira, iluminando a cena. Os inimigos estavam já em marcha para Tecis, e deram de caras com a guarnição aliada. Figuras negras deformadas, de orelhas pontiagudas, presas enormes, alguns com asas, outros com compridas caudas, espinhos, e feições infernais que tais. Em apenas um segundo a batalha estava lançada. Hamut empunhou a sua lança com as duas mãos e empalou três inimigos de uma vez. Hera rodopiou no ar, atirando pequenas lâminas que cravaram os peitos de quatro. Arati e Jhoser, guerreiros que ganhavam batalhas sozinhos, lutavam como que numa dança mortal, cortavam tudo à sua volta, ziguezagueando por entre soldados aliados e inimigos com gentileza e astúcia.
                Em tudo a batalha parecia estar ganha, mas mais e mais reforços inimigos chegavam de Amalid.
                — Retirada! – gritou Hamut.
                Sem dar as costas à batalha, soldados aliados voltaram para trás. Muitos sacaram dos seus arcos para cobrir a retirada. Arati sacou da sua besta, e Hera da sua pedra azul, com um estranho símbolo arredondado. No reboliço da retirada, vários soldados foram mortos. Viam já o fim da mata, correram para campo aberto. Correram o mais que puderam.
     Foi aí que, sem aviso nem pretexto, o viram. O gigante de que os fronteiriços falavam. O tal, que destruía os campos, que derrubava portas, que levantava torres, que com um sopro esmagava soldados e que com um olhar os desalmava. Esse, que estava na sua frente, um colosso mais que um gigante. Uma criatura de tamanhos desproporcionais, de grunhidos infernais, e de olhar petrificante. Ao ver tamanha besta, Hera fechou os olhos e conjurou a sua mais profunda energia. Todos os soldados ficaram apaziguados, e prepararam-se para o embate. O monstro irrompeu para a frente, enquanto levava uma saraivada de flechas. Mas ele não se importou. Pisou um punhado de soldados com o primeiro passo, e mais outro com o segundo. Aproveitando a abertura, os outros fugiram, mas muitos foram também apanhados pelo exército inimigo nas costas.
    — Faz alguma coisa! – disse Hamut a Hera
    Enquanto corriam – agora de costas para a ação – apavorados de volta à cidade, ouviam-se gritos lá atrás. Hera tentava de tudo, para que não parassem de correr. Caiu redondo no chão, deixando cair a pedra azul. Jhoser apanhou-o e levou‑o às costas até ao forte.
    A pedra lá ficou, na lama branca, pisada e pisada e pisada. Por besta, por homem, por monstro, por espírito, por fada. Escondida, até que alguém a visse, pegasse, e estudasse.
   Até que alguém a usasse, e com ela dominasse os povos das Montanhas, até que um herói aparecesse, trazendo promessas de glória eterna, de vitórias majestosas e de paz. Que desse alento aos Reinos das Montanhas, e eventualmente conquistasse a Montanha Preta de volta, enxotando os traidores para lá da Floresta de Ant.